1 – Os dias sucedem-se a ritmo padronizado. Como se construídos em séries de paredes mostrando repetidos mosaicos variando pouco as cores. 24h sobre 24h, 1/3 para dormir, o resto para arrumar gavetas, dedilhar toques em aparelhos de comunicação ou simples informação digital…por vezes fazer rodar o semicírculo de focagem de um binóculo para visitar a varanda de algum vizinho de meia distância que dança, toca violão ou simplesmente fuma um cigarro na companhia do cão. Catedrais de consumo, transformadas em montanhas de perigos em cujos cumes nos aguarda o pão e a água que temos de pegar e levar. Regras e mais regras. A primeira, portarmo-nos bem como convidados forçados a um soturno baile “saturnali”, em que as outrora belas máscaras venezianas são agora mortalhas faciais de papel/tecido azulverde antibateriano e o caraterístico fétido dos canais, um envolvente adocicado odor a mãos prudentemente “desentimentalizadas”. Lembrando a labuta. O trabalho impossível dos possíveis. Ainda faltam coisas, mas usemos esta sinopse do dia a dia no novo normal. Pois então dir-se-á, faz-se o que se pode porque nem a todos sendo possível ficar-se de costas para a estante dos livros a falar para o écran da reunião zoom, vai-se para o trabalho por entre os perigos da chuva pandémica, a ver se no regresso continua tudo no sítio e na costumeira temperatura corporal.
2 – Uma sinopse bem aplicada ou aproveitada, remete ou deve dar contextualização a algo mais específico. Caminhemos então um pouco para jusante no sentido do descerrar do pano. Aparece agora uma exposição na galeria. Na Pedro Oliveira. Depois de períodos de intermitência com problemas intervalares de abre e fecha, provocados por arreliadoras situações ora óbvias ora pessoais, aqui estou com um caloroso aqui estamos! Trata-se de uma extensa coletiva. 57 artistas nesta exposição. Todos passaram ao longo dos anos pela galeria, proporcionando-nos maravilhosas exposições individuais. As obras foram escolhidas por mim, algumas guardadas há muito tempo. Não vieram de longe, pelo menos para a ocasião. A escala é “tesourenta” e o ambiente que a percorre assaz intimista. Bem sei…, também tinha de acontecer, porque se assim não fosse, lá se passaria o ano 30* sem uma alusão. Vai-se vivendo e morrendo, faz-se o possível do que se pode. E porque não coisas bonitas contudo…? Tão ajustadas quanto apropriadas, as palavras do professor Mr. Keating (o inspirador Robin Williams) aos seus alunos em “The Dead Poets Society”*.. “Carpe Diem, Seize the day, boys”.
Pedro Oliveira (Galeria Pedro Oliveira)
Notas importantes:
* (Galeria Pedro Oliveira – inaugurada no Porto, Portugal, em 19 Janeiro de 1990)
* (The Dead Poets Society – filme de Peter Weir, 1989, estreado em Portugal em 19 Janeiro de 1990)