Paradoxo(s) da Arte Contemporânea: Diálogos entre os acervos do MAC USP e do Paço das Artes

Lugar de exposición
Individual / Colectiva
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Fecha inicial (1) / final (2)
Fecha exacta
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Proyectos expuestos
Descripción / Sinopsis

Ana Magalhães e Priscila Arantes
Curadoras

Nessa mostra de parceria entre o MAC USP e o Paço das Artes, tomamos por princípio o cruzamento entre o acervo do Museu e o acervo do Paço - entendido aqui como a documentação e o arquivo que esta instituição criou a partir de seu programa de exposições e sua contribuição para a memória da arte contemporânea, questões centrais também para o MAC USP. Nesse diálogo, procuramos cotejar e acompanhar artistas que fizeram a história do Paço e estão presentes no acervo do MAC USP. A escolha da obra de Regina Silveira como fio condutor para a seleção dos demais artistas e as questões levantadas pela exposição confluía não só para essa história institucional comum, como também para as inquietações que a curadoria de ambas as instituições tem levantado no que diz respeito à produção contemporânea.

Paradoxo do santo, de Regina Silveira, é o ponto de partida dessa curadoria. A instalação foi originalmente realizada para o Museo del Barrio, em Nova York, para uma mostra na qual a artista participou em 1994, tendo dado entrada no acervo do MAC USP logo em seguida. O que a artista propõe aqui é o que ela mesma chama de uma "instalação ambiental", na qual contrapõe a imagem popular de um santo - Santiago Apóstolo ou Santiago Matamoros, patrono militar da Espanha e do Novo Mundo - e a grande sombra distorcida e projetada do famoso monumento equestre dedicado a Duque de Caxias - patrono das forças armadas brasileiras - concebido pelo célebre escultor modernista Victor Brecheret. A artista refletia, assim, sobre os conflitos de dominação da América Latina, a gigante subjugada ao poderio luso-espanhol, e que ainda vive sob um regime de colonialidade. Invertendo os sinais, com a sombra do monumento equestre de formas clássicas sendo parte do patrimônio e da história brasileira, e a pequena imagem popular do santo como um referente do centro, Silveira aponta para as contradições dessas relações de força e para a história conflituosa entre esses dois territórios.

A partir dessa instalação, do efeito da sombra e seus significados, abrimos um leque de trabalhos de Regina Silveira que daí se desdobraram em outras questões vizinhas. Fazem parte da exposição Inclusões em São Paulo, a série Interferências, Infernus, Enigmas e Anamorfas (álbum de gravuras que foi sua dissertação, na USP). Há uma ampla gama de materiais que a artista usou para conceber essas obras em diferentes momentos de sua carreira. Além da sombra distorcida ser parte integrante de muitas delas, Silveira revisita nelas a problemática do museu de arte na contemporaneidade, de como ele lida com proposições artísticas que demandam outros modos de documentação, apresentação e conservação. Ela ainda necessariamente trata da questão da memória e de como se constroem as narrativas dentro de nossas instituições. A ideia de território, de mapa e o papel da cidade nessa chave também são questões candentes em seus trabalhos aqui apresentados. Regina Silveira coloca-se assim dentro de uma poética que se aproxima ou lança luz sobre questões ativistas e insurgentes. As gravuras do álbum Anamorfas são, por fim, uma espécie de síntese entre a ideia paradoxal da sombra e sua real ameaça, ou potencial de violência, já que as sombras, nesse caso, são de objetos cortantes. Embora comuns no ambiente doméstico, eles podem ferir ou até matar.

O museu, o território, o ativismo e a violência são questões que orientaram a seleção de obras dos demais artistas. O museu e seu paradoxo são revisitados nas proposições de Fabiano Gonper, Felipe Cama e Antoni Muntadas. O território e seus conflitos emergem nas proposições de Giselle Beiguelman, Gilbertto Prado, Rosângela Rennó, Alex Flemming e Nazareno Rodrigues. O ativismo e as poéticas militantes estão presentes nos trabalhos de Eduardo Kac e Tadeu Jungle. A violência é inerente aos trabalhos de Thiago Honório, Fernando Piola e Hudinilson Jr. Essas constelações não são núcleos ou temas rígidos na exposição, mas formam redes de contatos sobrepondo-se umas às outras Nas palavras da própria Regina Silveira, são artistas que compartilham com ela da mesma "pelagem", sem que necessariamente sejam da mesma espécie.

A exposição não tem uma disposição linear nem cronológica, mas procura fazer um diálogo entre os artistas dentro desses paradoxos que a arte contemporânea propõe na atualidade.